A primeira disciplina do doutorado não foi apenas um marco formal no calendário acadêmico. Foi, antes de tudo, um deslocamento interno. Tópicos em Políticas Educacionais, dedicada ao estudo do Materialismo Histórico-Dialético, chegou como uma experiência que exigiu mais do que leitura atenta e cumprimento de tarefas. Ela me convocou a revisar a forma como eu vinha compreendendo a educação, a pesquisa e o próprio mundo material e social.
Desde os primeiros encontros, tornou-se evidente que não se tratava de aprender um método no sentido técnico ou instrumental, desses que prometem caminhos seguros e respostas rápidas. O MHD não oferece conforto, muito pelo contrário, ele exige enfrentamento. Ao discutir sua teoria do conhecimento, fui levado a reconhecer que o real não se revela de imediato, que as aparências frequentemente ocultam as determinações essenciais e que compreender o mundo e seus organismos implica ultrapassar o plano do visível para alcançar a trama histórica que sustenta os fenômenos.
O estudo dos fundamentos da economia política produziu em mim um desconforto necessário. Pensar o modo de produção capitalista, suas bases materiais e suas formas de organização social significou reconhecer como essas estruturas atravessam a educação, moldam políticas públicas e redefinem sentidos formativos. Nada se apresentava como isolado ou neutro. A educação, nesse percurso, para mim deixou de ser compreendida apenas como espaço de emancipação abstrata para se revelar como campo de disputas, atravessado por interesses, contradições e relações de poder.
As categorias centrais do MHD passaram a operar como modos de pensar. A contradição deixou de ser algo a ser evitado e passou a ser assumida como “motor da realidade social”. A mediação revelou que os processos educativos não se constituem de forma direta ou linear, mas são atravessados por múltiplas determinações históricas e sociais. A totalidade, talvez a categoria mais exigente, impôs o desafio de abandonar leituras fragmentadas e reconhecer que cada fenômeno só ganha sentido quando situado no conjunto das relações que o produzem.
Houve momentos de exaustão intelectual. Textos densos, conceitos rigorosos e a sensação constante de que o pensamento precisava reaprender a caminhar. Mas foi justamente nesse esforço que emergiu um aprendizado decisivo: é preciso desenvolver o hábito da abstração. O MHD não se apresenta apenas como uma epistemologia para a pesquisa em educação, mas como uma postura crítica diante da realidade. Ele nos obriga a perguntar a quem servem determinadas políticas, em que contextos são produzidas e quais interesses sustentam sua aparência de neutralidade.
Ao concluir a disciplina, percebi que algo havia se transformado. Não porque agora detenho respostas prontas ou verdades acabadas, mas porque aprendi a formular perguntas mais rigorosas e mais comprometidas com a historicidade dos fenômenos educacionais. Compreendi que pesquisar em educação a partir dessa perspectiva implica assumir um compromisso ético e político com a crítica das estruturas sociais e com a recusa de explicações superficiais.
Se o doutorado é um percurso em construção, essa primeira disciplina foi o solo onde pude fincar os pés. Um solo exigente, marcado por tensões e contradições, assim como a realidade que ele nos ensina a compreender. Talvez seja esse o maior aprendizado deste início de caminhada. Pensar criticamente não oferece conforto, mas oferece sentido. E, neste momento, isso já é suficiente para seguir adiante.

Comentários
Postar um comentário
♥ Seja sincero(a)!
♥ Criticas (construtivas) , sugestoes , elogios são bem vindos.
♥ Por favor, sem palavrões ou ofensas.
♥ Comentários bem elaborados serão retribuídos.
♥ Comentários com spam serão automaticamente removidos.
bjs/abraço, volte sempre!